No mes de abril de 1964 ja com Castelo Branco instalado como Presidente, as mudancas foram bastante nitidas: Goulart deposto, Brizola em exilio, o Congresso capenga e a expectativa no ar. Entretanto, Castelo prometia a redemocratizacao e as eleicoes ainda estavam marcadas. Na medida, que os militares, seus aliados civis e a classe politica foram acomodando, a sociedade civil assistia inicialmente aliviada mas a preocupacao e mal estar seria crescente. A midia dominante pregava o medo do comunismo e com certeza tinha apoio quase total dos governos estrangeiros, principalmente dos EUA. Respirava com alivio que o Brasil nao seria Cuba multiplicado por 10 ou 100.
Uma vez instalados, os militares, os tecnocratas e os politicos se justificavam com todo tipo de raciocinio mas no fundo era um golpe conservador apoiado pelos setores conservadores de uma sociedade em transicao. Vale lembrar que em 1960, o Brasil ainda era um pais ainda rural embora a migracao NE para SE ja era um constante.
Desmobilizada e controlada, o populismo do PTB, Jango e os demais herdeiros do Getulismo deixou de ser uma forca politica. Os partidos foram extintos e no seu lugar surgiu ARENA e o MDB. O brutalidade e recrudescimento crescia e atingiu o auge com o AI-5 e os anos de chumbo do Medici. Mas por baixo, a sociedade estava envergonhada, ate os militares ou pelo menos certos setores tinham descomforto. Sabiam que nao eram legitimos. Assim, a permanencia pelo menos do calendario eleitoral foi importante e a oposicao gradativamente foi crescendo e surprendeu tanto nas eleicoes de 1970 e mais ainda em 74. A luta foi passando da guerrilha precaria e vencida para o campo politico mais amplo. Com certeza os atos tressloucados dos guerrilheiros galgavam certa simpatia nao pelo ato em si mas pela resposta brutal e estupida do governo. Quem queria viver baixo o arbitro dos uniformizados?
Gradativamente, a sociedade civil foi ganhando espaco e gradativamente chegamos a liberacao politica. Infelizmente, os interesses particulares e os lobbies tomaram conta do processo da Constituinte. A Constituicao de 1988, melhor do que a dos militares em muitos sentidos e principalmente como protecao formal dos processos democraticos deixou muito a desejar na parte operacional. A percepcao era que se seu grupo ou interesse nao tinha um capitulo a parte na constituicao entao voce corria risco. Assim hoje, estamos com um problema onde interesses limitados travam o progresso de ideias e projetos mais amplos. A coisa precisa ser mais simple a nivel da Carta Magna.
Por erro ou ma sorte, Tancredo morreu e tivemos que aguentar mais 5 anos do regime antigo com Sarney mas finalmente chegou as eleicoes direta em 90 com Collor vs Lula. O “moderninho” seduziu tanto a elite quanto o povao com um discurso atraente mas sem embasamento real. Resultado apenas a continuidade da corrupcao a la Sarney e os militares ate que os escandalos tornaram obvios e insustentaveis. FHC foi eleito com o sucesso do Plano Real e conseguiu sua reeleicao de uma forma um pouco casuistica. Entretanto entregou a faixa para Lula que bem representou a cara do Brasil para o bem e o mal. Lula cedeu como tinha que ceder as pressoes do PT e o PT tambem cedeu as pressoes do poder. Ampliou e apoderou-se do Estado e acabou alastrando a incompetencia, a falta de controle (sob o pretexto de muitos controles) e estimulou ou continuou a corrupcao como “business as usual”.
Quem esta na rua hoje, talvez nao lembre e nao viveu os acontecimentos desde 64. Afinal a populacao, embora envelhecendo rapidamente, ainda e jovem. Mas todo mundo sabe que nao chegamos onde queremos. Eh muito bom ter Copa e Olimpiadas mas na realidade, os eventos (mega ou nao) expoe as fendas. Como construir uma sociedade de mais oportunidade, de maior igualdade, de uma cordialidade real e nao mitica? Estes sao os problemas que ainda existem. A luta continua.